O juiz federal Walter Bento ordenou, nesta terça-feira, a intervenção na sede da operadora de TV a cabo Cablevisión, do grupo Clarín, o maior do setor de multimídia da Argentina, que interpretou o fato como parte de uma "perseguição" do governo de Cristina Kirchner.
Cinquenta agentes da polícia militar entraram na sede da Cablevisión em Buenos Aires, cumprindo ordens do magistrado da província de Mendoza (oeste), por denúncia de "exercício presumível de concorrência desleal" e "posição dominante".
O juiz designou um "interventor coadministrador" depois da queixa apresentada pela empresa concorrente Vila-Manzano, titular do Supercanal, também de televisão a cabo, segundo Ricardo Mastronardi, advogado do funcionário designado interventor pela Justiça, Enrique Anzoise.
"Não podemos separar este episódio da escalada do governo nacional contra o grupo Clarín", disse o gerente de Comunicações, Martín Echevers.
De acordo com o "Clarín", o grupo de multimídia Vila-Manzano, a que pertence o Supercanal, é um aliado fundamental do governo argentino.
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Protestos sindicais interromperam entrega do "Clarín" em março; jornais disseram que governo ignorou a Justiça |
A operação é "considerada sem precedentes, inscrevendo-se numa campanha sistemática de perseguição que o governo nacional realiza contra as empresas do Grupo Clarín", afirmou a Cablevisión em comunicado.
A ação durou cerca de três horas. Membros do Judiciário e policiais se retiraram do local depois que os advogados da empresa reclamaram que eles não tinham jurisdição para tal ação, embora não esteja claro quem ordenou a retirada da polícia, órgão dependente do Ministério da Segurança.
Em defesa da administração federal, o ministro do Interior, Florencio Randazzo, disse que "é um disparate" considerar que a ordem partiu do governo de Cristina Kirchner, sustentando que o Corpo de Gendarmes "atua como auxiliar da Justiça".
CONFRONTOS
O governo Kirchner e o grupo empresarial que publica o jornal "Clarín", o de maior circulação na Argentina, mantêm um confronto que cresceu nos últimos dias.
O fato acontece num momento em que o Senado se prepara para votar uma lei polêmica que declara de interesse público o papel jornal, que tem como único fabricante a Papel Prensa, controlada pelos diários "Clarín" (49% das ações) e "La Nación" (22,49%), os dois maiores da Argentina, enquanto o Estado possui uma participação de 28,08%.
Segundo imagens dos canais de notícias, o interventor Anzoise, que não substituirá o diretor da empresa, foi agredido por empregados ao deixar o prédio da Cablevisión num bairro do sul da capital argentina.
Mastronardi explicou que Anzoise "terá um prazo de 60 dias para analisar toda a documentação" e elaborar um relatório para o juiz Walter Bento.
Leo La Valle/Efe | ||
Leitor segura exemplar do "Clarín" de março deste ano; jornal deixou capa em branco em protesto ao governo |
Já Sandra González, da entidade de defesa do consumidor Adecua, apoiou a decisão judicial assinalando que "quando houver abuso de posição dominante fica caracterizada a concorrência desleal e, lamentavelmente, o grupo em questão não pode fazer o que pretende".
O grupo Clarín administra 60% do mercado da televisão a cabo na Argentina e 90% na área da capital e periferia, que possui 14 milhões de habitantes, segundo o canal de notícias América 24.
A Cablevisión conta com mais de 3.300.000 assinantes distribuídos na Argentina, no Uruguai e no Paraguai. Na Argentina, está presente em 96 cidades e em 12 províncias, informa a empresa em sua página na internet.
SAIBA MAIS
A intenção do governo argentino de legislar sobre a fabricação e a distribuição do papel para jornais e o estabelecimento da Lei de Serviços Audiovisuais, que determina a abertura do setor, são algumas das questões de disputa entre Cristina Kirchner e os donos dos principais jornais do país.
A fábrica Papel Prensa foi fundada em 1972 e adquirida pelos principais jornais argentinos, "Clarín" e "La Nación", durante a ditadura, fato que está sendo investigado pela Justiça por conta das denúncias de que foram cometidas violações aos direitos humanos neste processo.
Para a Adepa (Associação de Entidades Jornalísticas Argentinas), os últimos dois anos foram os mais difíceis para os meios de comunicação argentinos desde a retomada da democracia em 1983.
A entidade alega que jornalistas e diretores de meios de comunicação vêm sofrendo "danos pessoais e injúria" por parte de funcionários ou setores ligados ao governo.
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